Cancro gástrico – uma atualização a propósito de notícias recentes

Recentemente foi notícia em vários meios de comunicação social que investigadores do IPO do Porto liderados pelo Prof. Doutor Mário Dinis Ribeiro ganharam o prémio Bial® por investigação na prevenção do cancro gástrico.

Estes investigadores advogam o início de um programa de rastreio para o cancro gástrico (à
semelhança do que já existe em Portugal para o cancro colorectal e para o cancro gástrico noutros países) que muito beneficiaria a saúde dos portugueses.

Portugal é um país de elevada incidência de cancro gástrico (especialmente no Norte do país) e, por isso, é de extrema importância que a população portuguesa compreenda os factores de risco e a maneira pela qual podem pedir aconselhamento sob este problema grave de saúde pública.

Em 2016 verificaram-se 2885 mortes em Portugal por cancro gástrico, representando 3⁄4 da mortalidade em acidentes e nove vezes mais do que as mortes relacionadas com VH/SIDA. Se nada for feito, esta neoplasia pode vir a vitimar 9 portugeses por dia no prazo de 20 anos…

O cancro gástrico é muito frequente?

  • Em 1975 era o cancro mais frequente a nível mundial.
  • Atualmente é o quinto cancro mais frequente mundialmente. Contudo, é o segundo cancro que mais pessoas mata em todo o mundo.
  • É mais frequente nos países asiáticos e na Europa do Leste mas Portugal tem das maiores incidências deste cancro dentro dos países da União Europeia, especialmente no Norte do país.

O cancro gástrico é habitualmente curado?

  • Infelizmente não. Aquando do diagnóstico, cerca de 50% das pessoas tem doença com invasão de outros órgãos ou metastização (“raízes” para outros órgão) à distância, não sendo possível oferecer tratamentos curativos.
  • Se melhorarmos a perceção das pessoas desta doença poderemos diagnosticar este cancro muito mais precocemente, podendo efetuar tratamentos curativos.

O cancro gástrico é assim tão difícil de diagnosticar?

  • Sim e não:
  • O diagnóstico é habitualmente efetuado através de uma endoscopia digestiva alta (que pode ser efetuada sob sedação), que é um exame de fácil acesso em Portugal.
  • Infelizmente o cancro gástrico apenas dá sintomas muito tardiamente, o que leva com que as pessoas não procurem o seu médico.

Quais são então os sintomas mais frequentes do cancro gástrico?

  • Os sintomas mais frequentes são a dor abdominal persistente e a perda de peso inexplicada.
  • Há outros sintomas que também podem ocorrer como as náuseas persistentes, a disfagia (dificuldade em engolir), o enfartamento e perdas de sangue pelo tubo digestivo.
  • O problema destes sintomas é que são muito inespecíficos e apenas se apresentam em estadios avançados da doença.

Quais são então os fatores de risco para o cancro gástrico?

  • São vários e habitualmente o cancro nasce duma conjugação desses fatores de risco. Seguem-se os mais frequentes:
  • Dieta: o sal e os alimentos preservados em sal são fatores de risco há muito conhecidos. Já a ingestão regular de frutas, vegetais e fibras é protetora.
  • Tabagismo
  • Obesidade
  • Alterações da mucosa (camada superficial do estômago) como a metaplasia, atrofia e displasia (alterações das células do estômago, diagnosticadas após uma endoscopia)
  • Cirurgia gástrica prévia
  • História familiar em primeiro grau de cancro gástrico
  • Infeção pelo Helicobacter pylori (responsável por pelos menos 50% dos cancros gástricos)

O que é isso da infeção pelo Helicobacter pylori (bactéria do estômago)?

  • O Helicobacter pylori é uma das bactérias “mais bem-sucedidas” do mundo, infetando cerca de 50-80% da população mundial
  • Esta bactéria é considerada um carcinogénio tipo 1, ou seja, é um factor de risco definitivo para o aparecimento de cancro gástrico

Então toda a gente deve pesquisar e efetuar tratamento para esta bactéria?

  • À luz da ciência atual, não!
  • Apenas nos países de alta incidência (países asiáticos) está comprovado o benefício do tratamento desta bactéria em pessoas sem sintomas ou sem história familiar de cancro gástrico.
  • Mas, como demonstraram os investigadores do IPO-Porto, em Portugal efectuar rastreio e tratamento do Helicobacter pylori aquando do rastreio do cancro colorectal (tipicamente aos 50
    anos) pode ser uma maneira eficaz e custo-efectiva para diminuir a mortalidade e, idealmente, a incidência do cancro gástrico.

Qual é o caminho a seguir?

  • É fundamental sermos mais rápidos a detectar este cancro. Mas, mais do que isso, devíamos ser muito mais eficazes a preveni-lo e esse deve ser o caminho a seguir:
  • Correção dos fatores de risco
  • Sensibilização das pessoas em risco
  • Investigação adequada das pessoas com sintomas e/ou fatores de risco
  • Implementação de um programa de rastreio (e prevenção), especialmente em populações de alto risco
  • Erradicação (tratamento) da bactéria, eventualmente a nível populacional
  • Pergunte ao seu médico de família ou contacte um Gastrenterologista se acha que tem fatores de risco ou sintomas associados ao cancro gástrico